Tardelli revela sondagens de São Paulo e Corinthians, se vê fora da seleção por enquanto.
Engana-se quem pensa que a ida de Diego Tardelli para o Shandong Luneng, da China, o tirou da mira dos grandes clubes brasileiros. Desde a transferência para o outro lado do mundo, em janeiro, o atacante já foi sondado por Corinthians e São Paulo. O alto investimento feito pelos chineses — cerca de R$ 23,4 milhões — e o salário do jogador, superior a R$ 1 milhão por mês, inviabilizaram o retorno ao país. A revelação do interesse dos rivais paulistas foi apenas uma das revelações de Tardelli em entrevista ao Blog, direto de Shandong, por telefone. Durante quase 40 minutos, ele reconheceu que era corintiano na infância, declarou amor ao Atlético-MG, admitiu que não espera voltar a ser lembrado para a seleção brasileira na China, contou sobre a vida do outro lado do mundo e explicou como trocou a fama de “bad boy” do início da carreira por uma conduta bem mais tranquila, sem atrasos, faltas e polêmicas.
BLOG_ Você se mudou para a China em janeiro. Já está adaptado à vida do país?
DIEGO TARDELLI_ Estou me adaptando um pouquinho mais a cada mês. Morei em São Paulo, em Belo Horizonte, no Rio, que são muito diferentes de Shandong. A cidade não tem muitas coisas para fazer, então, praticamente não há vida fora de casa. A sorte é que minha mulher e meus filhos vieram.
Pimenta, escorpião, cachorro… Como é a sua dieta alimentar?
Eu praticamente não como fora de casa. Quando me mudei, trouxe quilos e mais quilos de feijão, a única coisa que não existe na China em relação às comidas que temos no Brasil. Nossa empregada, que é brasileira, cozinha tudo em casa.
E a língua é impraticável?
É muito complicada. O clube tem três tradutores, mas nem sempre nós saímos com eles. Então, quando me aventuro a fazer alguma coisa, vou na mímica, no gesto…
Antes de ir ao Shandong Luneng, você já havia morado na Espanha, na Holanda, na Rússia e no Catar. Dá para fazer alguma comparação com a vida de estrangeiro na China em relação a esses países?
Ah, não dá. Certamente, a China é o país mais difícil em que vivi. O maior problema é a cidade, que fica no interiorzão, apesar de ter seis milhões de habitantes. Se ainda fosse em Xangai, Pequim ou Guangzhou… Mas Shandong tem dois shoppings, e só.
Qual foi a maior maluquice que você viu por aí?
Os chineses têm um hábito bem estranho, que é o de colocar os filhos pequenos para fazer xixi em qualquer lugar. Outro dia, estava no hospital fazendo uma ressonância quando uma mãe abriu o zíper do macacão do filhinho e ele fez xixi em pleno hospital.
Por que o Shandong, que conta com você, Montillo, Aloísio, Jucilei e Junior Urso, ficou fora da briga pelo título da Superliga Chinesa?
O nosso elenco é muito forte, principalmente por causa dos estrangeiros, mas acabamos perdendo para o time do Conca (Shanghai East Asia) na última rodada e não temos mais chances. No clube, há uma dependência muito grande dos chineses em relação a nós. Eu, por exemplo, não fui tão bem.
Você chegou a fazer 39 gols em um único ano, em 2009. Por que só tem seis em 2015?
O ano foi muito ruim para mim e isso tem muito a ver com o entorse no joelho que tive antes da Copa América. Até hoje sinto dores. Para falar a verdade, não vejo a hora de 2015 acabar para começar 2016 do zero.
Você ainda tem mais três anos de contrato. Há chance de voltar ao Brasil em janeiro?
Pretendo ficar na China por mais uns dois anos. Quero e preciso me firmar no país. Até porque todas as passagens que tive fora do Brasil foram de, no mínimo, um ano e meio. Vamos ver se eu aguento.
E está recebendo muitas ofertas do Brasil?
Tive de alguns clubes de São Paulo, mesmo. Corinthians e São Paulo me procuraram. O Atlético-MG também é sempre uma opção, falo constantemente com os jogadores e a diretoria, e as portas do clube ficaram abertas para mim.
Como foram as propostas do Corinthians e do São Paulo?
São coisas normais do mercado. Graças a Deus, tenho muito moral no mercado brasileiro. Tive contato com pessoas do Corinthians e também falei com gente do São Paulo. Mas tenho a intenção de ficar mais um pouco na China.
É verdade que você era corintiano na infância?
Era, sim, por causa de alguns amigos corintianos. Quando cheguei no São Paulo, para a base, até falavam que tinha um corintiano jogando pelo São Paulo. Mas acabei virando são-paulino, porque foi o clube que me deu oportunidade. Inclusive, o maior rival na base era o Corinthians. Hoje, sou Galo.
Por causa do sucesso da última passagem?
É até difícil descrever o carinho e a paixão que tenho por esse clube e essa torcida. Por tudo o que aconteceu. Tenho certeza de que ainda volto para o Atlético-MG. A vida da minha família também tem tudo a ver com Belo Horizonte. Tenho alguns investimentos na cidade, a minha esposa tem loja.
Tem visto o Brasileirão?
Acompanho, sim, pela internet, porque a TV não tem canal de esporte. Vemos tanto que até brincamos no Cartola (jogo em que os pontos se dão graças ao desempenho dos atletas no Brasileirão). O Junior Urso lidera a nossa liga, o Montillo é o segundo e estou em terceiro.
Você virou o ano como jogador da seleção, mas não tem sido mais chamado. Acha que ainda pode ser chamado enquanto jogar na China?
Eu sei que não vou ser convocado. Tenho consciência disso. Até a minha convocação para a Copa América ocorreu pelo que fiz no Brasil, no ano passado, não por causa do meu futebol na China. Preciso de visibilidade maior, jogar em um campeonato com nível diferente para ser lembrado.
Mas compensa abrir mão da seleção pelo dinheiro?
O sonho da minha vida é disputar uma Copa do Mundo, mas a decisão de ir para a China foi minha. Ninguém me obrigou. Abri mão de tudo isso pensando no futuro da minha família. No país, tenho o maior contrato da minha vida.
Por isso que você quer permanecer mais um tempo?
Sim, com certeza.
Qual avaliação faz do seu desempenho na Copa América?
A seleção não se deu tão bem no campeonato e, para mim, também não foi dos melhores. Fiz um jogo só, contra o Peru. Queria ter participado mais. Só que a minha esperança de voltar no futuro existe, porque fiz bons jogos com o Dunga.
O Ricardo Oliveira foi a grande surpresa da última lista, teoricamente, no seu lugar. Ele mereceu a convocação?
Com certeza. É o melhor atacante no futebol brasileiro, hoje. Eu sempre gostei da característica do futebol dele, assim como do Luís Fabiano, do Fred, do Lucas Pratto. É matador e ainda tem inteligência.
Assistiu à estreia do Brasil nas Eliminatórias?
Não vi. O jogo foi às 7h30 da manhã na China.
Você é do tipo consumista ou guarda o dinheiro?
Eu já gastei muito no início da carreira, mas mudei. Tenho uma esposa que controla tudo, além de pessoas que cuidam da minha parte financeira.
Você já teve uma fase rebelde na carreira, na qual colecionava problemas extracampo. O que o levou a mudar?
Foram várias coisas. O amadurecimento natural, o fato de ter casado e ser pai, as pancadas que tomei… E foram várias. Em 2009, quando cheguei ao Atlético-MG, percebi que estava jogando fora a grande oportunidade que o futebol me dava. Antes, eu era um moleque sem responsabilidade. A partir daí, virei jogador de verdade.
Mas teve algum fato que o transformou, em especial?
Tudo na minha vida aconteceu muito rapidamente. Com 18 anos, comecei a ganhar salário alto, depois de anos de muita dificuldade. As pessoas diziam que eu precisava parar de aprontar, mas tem de partir do jogador. Eu evoluí. Aí, encontrei um pastor em Belo Horizonte que se chama André Valadão, que me ajudou demais. Em 2010, virei evangélico.
Você falou em várias pancadas. Qual foi a pior?
Foi em 2005, quando fiquei fora do Mundial de Clubes com o São Paulo. Cheguei atrasado depois de uma festa da minha esposa e nem me deram chance de explicar. É verdade que eu já tinha dado algumas mancadas. Aí, me afastaram a três meses do Mundial e acabei emprestado para a Holanda. Foi triste ter desperdiçado a chance de ser campeão mundial.
Qual seu ídolo de infância?
O Ronaldo foi o cara que mais admirei. Tive a chance de encontrá-lo algumas vezes e sempre foi muito legal. Neste ano, cruzei com ele em Paris. Até batemos um papo.
E qual foi o melhor técnico com quem trabalhou?
O cara mais importante foi o Emerson Leão. Ele que me segurou e me bancou no São Paulo. Depois, ainda me levou para o Atlético-MG. Também gostei do Paulo Autuori, do Levir Culpi e do Muricy Ramalho. E falam tão bem do Tite que tenho vontade de trabalhar com ele.